Todo ano, pra mim, tem uma forma de espiral, que gira e gira, ascendendo numa região ora nebulosa, ora transparente e escura, como nos apresenta o espaço sideral. Todo ano tem uma cor clara, entre branco e azul e amarelo. Assim também são os meses, as semanas e os dias, cada um com determinada variação dessas cores... Lembro-me que em uma das aulas com meu querido professor de Filosofia da FACHI, o José Carlos, discutimos sobre isso e não me lembro mais a qual conclusão chegamos, mas tinha a ver com nossa percepção de mundo, do Tempo. Para uma amiga, o ano tem um formato de uma barra, com os anos iniciando embaixo e terminando num nada... acima, sem um se ligar ao que se foi...
Escrevo isso porque em agosto escrevi sobre as possibilidades que nos são dadas naquele mês de ventanias e sinais de mudanças...
Em 2011 tive muito trabalho nas duas escolas. Turmas tão díspares e tão cheias de identidades. Ao mesmo tempo em que existem alunos sem a menor identificação com a leitura de texto e muito menos com a escrita, outros já não conseguem ficar sem essas duas ferramentas de expressão cultural, buscando produzir algo que demonstrem a si mesmos e suas interpretações de mundo...Ainda bem que assim seja.
Através do Facebook, reatei contato com antigas amizades, estabeleci outras, virtuais.
Descobri que o que me resgata e desvia de uma situação paralisante é o ato mesmo de caminhar, proposta inicialmente feita pela Maria, uma vizinha, amiga de infância, que me propôs caminhar na pracinha próxima a minha casa. Gostei, principalmente do estado de profundo relaxamento e euforia que vivenciei após andar por um determinado período. Talvez também seja uma forma de viver de maneira mais intensa aquilo que foi retirado de meu finado marido, numa estranha relação aos dias que passou numa cadeira de rodas, dependendo de todos pra tudo, durante seus últimos onze anos de vida. Estranho, passa-se o tempo, porém sinto-me mais próxima dele, e no entanto, ele não mais existe, a não ser em minha mente...
Essa atividade me pôs em contato com um grupo de caminhantes, veteranos na estrada, e assim me lancei em janeiro desse 2012 numa viagem a pé num trecho da Estrada Real, caminhando 22 km.
Também naquele mês, vi coisas que me surpreenderam muito positivamente e uma delas foi uma rádio, em forma de podcast, chamada Vidro Azul. O mentor dessa rádio é um português que mora nos EUA e posta músicas, pra mim, totalmente inéditas e belíssimas, e como ele, Ricardo Mariano, às vezes diz, viciantes...A marca dessa rádio singular é uma foto em preto e branco de uma janela, com um vasinho com margaridas. Às vezes, as transmissões me conduzem a um estado de profunda tranquilidade, outras vezes, a uma imensa tristeza...Fico pensando no porque desse nome: Vidro Azul. Lembro de que quando era criança brincava com um vidro de leite de magnésia azul. Era uma espécie de amigo imaginário com o qual conversava muito, e isso me ajudava a entender aquele mundo ao meu redor. Infâncias...Depois me lembrei que uma amiga morava numa casa antiga, do século XIX, cujas janelas são adornadas por um vidro azul, raríssimo e muito bonito. Evitar que quebrem é uma constante para aqueles que lá residem. Então o nome da rádio tem a ver com infâncias e raridades...Pra mim é o bastante pra explicar minha identificação com tais transmissões.
De todas essas trilhas que se mostram, a mais intrigante e difícil é a que se abre dentro de mim. Percebo-me propícia a alargar ao máximo minhas fronteiras, a estabelecer novas abordagens de temas antigos e a não temer o que vem pela frente. E, principalmente, a não perder a minha criança interna, aquele lado encantado pelo o quê a vida permite viver...Tudo passa, inclusive eu.